Homosexualidade, de Frank O’ Hara.

Fernando Impagliazzo
3 min readJun 11, 2020

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HOMOSSEXUALIDADE

então estamos tirando nossas máscaras, nós estamos, mantendo
nossas bocas fechadas? como se tivéssemos sido atravessados de relance

o som de uma vaca velha não é mais cheio de julgamento
que os vapores que escapam da alma quando estamos doentes

então empurro as sombras à minha volta como um sopro
e enrugo meus olhos como se no mais requintado momento

de uma ópera muito longa e, então, estamos desligados?
sem reaproximação e sem esperanças de que nossos pés delicados

tocarão a terra novamente, menos ainda, “muito em breve”
é a lei de minha própria voz que eu devo investigar

começo como gelo, do meu dedo ao meu ouvido, do meu ouvido
ao meu coração, aquele orgulhoso vira-lata na lata de lixo

na chuva, é maravilhoso admirar a si mesmo
com completa candura, registrando os méritos de cada uma

das latrinas. A 14ª quinta rua está bêbada e crédula
a 53ª hesita mas está muito em repouso. Os bons

amam o parque e, os ineptos, a estação de trem
e há os divinos que se arrastam para cima

e para baixo no prolongamento das sombras de uma cabeça Abissíniana
na poeira, rastreando seus longos elegantes saltos de ar quente

chorando para confundir os bravos “É um dia de verão,
e eu quero ser desejado mais do que qualquer coisa neste mundo”

Tradução: Fernando Impagliazzo

Frank O’ Hara foi um poeta norte-americano. Seu livro de estreia (Lunch Poems) foi publicado pela editora City Lights, de Lawrence Ferlinghetti, mesma editora que publicou Howl de Allen Ginsberg. Trabalhava no balcão de informações do MoMa, o que fez com que o poeta convivesse com artistas como Jackson Pollock, Willem de Kooning, John Cage e Merce Cunningham. Por essa razão, sua obra está permeada em referências à música e ao uso do ‘action painting’ da pintura expressionista. Morreu tragicamente, em 1966, atropelado por um jipe, na Fire Island. É, ainda, pouco traduzido no Brasil. Dentre os trabalhos, estão os de Paulo Henriques Britto e Beatriz Bastos, presentes na antologia “Meu coração está no bolso”, publicado pela Luna Parque em maio de 2017.

HOMOSEXUALITY

so we are taking off our masks, are we, keeping
our mouths shut? as if we’d been pierced by a glance!

the song of an old cow is not more full of judgment
than the vapors which escape one’s soul when one is sick;

so I pull the shadows around me like a puff
and crinckle my eyes as if at the most exquisite moment

of a very long opera, and then we are off?
without reaproach and without hope that our delicate feet

will touch the earth again, let alone ”very soon“
It is law of my own voice I shall investigate

I start like ice, my fingers to my ear, my ear
to my heart, that proud cur at the garbage can

in the rain, it’s wonderful to admire oneself
with complete candor, tallying up the merits of each

of latrines. 14th street is drunken and credulous,
53rd tries to tremble but its too at rest. The good

loves a park and the inpet a railway station
and there are the divine ones who drag themselves up

and down, the lengthening shadow of an Abyssinian head
in the dust trailing their long elegant heels of hot air

crying to confuse the brave “it’s a summer day
and I want to be wanted more than anything else in the world.”

Frank O’ Hara. Dos manuscritos do autor.
Março de 1954, intitulado 5.
Havia um Self-portrait with Masks de James Ensor anexado ao poema.
Em manuscritos tardios já recebe título similar (“The Homosexuals”) e é numerado “I”
Primeiramente publicado em Poetry, de 1970.

Self-portrait with Masks. James Ensor, 1899.

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Written by Fernando Impagliazzo

📕 professor, poeta e editor da toró editorial. Fale comigo 😃: https://linktr.ee/fpimpagliazzo

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